sábado, 30 de agosto de 2014

Diário de bordo: lei de Murphy, mamas e malas


Sabe a lei de Murphy? Ela existe. A uma semana da viagem e a fonte do meu notebook resolve queimar. Como começar uma vida menos consumista com um gasto desses? A largada já foi queimada. Mas tudo bem, eu tenho um tablet e vou usá-lo pra fechar os roteiros, organizar a documentação, escrever aqui no blog e tudo o mais.

Meu desafio do dia é pesquisar os sites das redes de fast foods londrinos que encontramo,  tentar achar as lojas perto de onde vamos passar, e assim tentar ter alternativas de refeições baratas no nosso caminho. Já me desanimaram, já me falaram que é impossivel, que na hora nunca dá certo, que você come em qualquer lugar, e bla bla bla. Mas eu vou tentar. Eu tenho fé, eu tenho foco, e estou me tornando uma escritora, péssima, de auto-ajuda (blargh).

Além disso, tenho que levar a Micaela ao veterinário, porque as mamas dela estão crescendo inexplicavelmente. E também ir pra casa da minha mãe, ajudá-la a arrumar umas coisas. Ela está de mudança. Vai ser minha vizinha. Quando eu voltar da viagem, vai ter uma nova moradora no meu prédio, minha mãe (vai ser muito amor, gente).

E voltando à viagem, quero fechar as malas hoje. O motivo é que além de não ter tempo durante a semana, quero adotar a estratégia de a cada dia ir revisando e retirando os exageros. Não posso acrescentar coisas, só retirar. Mas pra fazer a mala, eu conto com ajuda da listinha que a Mariana, minha sobrinha de sete anos fez. Ela colocou tudo o que deve se levar numa viagem e até dividiu a lista em setores: roupas e sapatos, higiene pessoal, variedades. A foto tá aqui, caso algum de vocês também esteja precisando de uma ajudinha pra fazer a mala.




Mando notícias do front, colegas!  

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Diário de bordo: delírios pré-viagem


Faltam nove dias para eu viajar com o Fabiano, meu namorado. Vamos para Londres, Paris e Berlim. Mas  eu quero contar um segredo pra vocês: desisti da viagem! É, surtei, chorei, puxei os cabelos, bati o pé no chão e gritei: não vou, não vou, não vou!!! Mas porque alguém desistiria de uma viagem assim, às vésperas? Aí eu vou ter que contar outro segredo. Vocês sabem aquele filme "Os delírios de consumo de Becky Bloom"? É aquele filminho bobo, estilo sessão da tarde, que a protagonista tem um caminhão de dívidas e nunca para de gastar? Pois é, eu sou aquela menina.

Confesso que até procurei um grupinho como o que a Becky Bloom frequenta. Achei vários, mas não cheguei a ir em nenhum, porque todos tinham uma pegada religiosa e isso me desanimou. Resolvi atacar o problema na análise. Tenho caminhando, com altos e baixos, idas e vindas. Mas mesmo que eu consiga largar essa vida, há um porém: o passado. Se o que dizem por aí que quem vive de passado é museu for verdade, então eu virei um museu enorme. Porque não posso abandonar as dívidas feitas nesse longo tempo de consumismo enlouquecido. E agora eu cheguei naquele lugar que as pessoas costumam chamar fundo do poço. Super endividada e sem crédito.  Então, quando me vi nessa situação, resolvi que precisava cortar o mal pela raiz e desistir da viagem. Mandei uma mensagem pro Fabiano, e disse "não vou mais!".

Fabiano levou um susto, óbvio! Quem manda namorar gente instável? Agora, senta e chora! Mas Fabiano não fez isso, não sentou nem chorou. Ele tentou me convencer de todas as maneiras de que não ir seria mais custoso do que ir, afinal as passagens e a estadia já estavam pagas (a minha parte jogada naquele bolo de dívidas), e eu não conseguiria recuperar todo o dinheiro, ou seja, pagaria para não viajar. Além de ser um desperdício financeiro, seria uma bad trip, passar as férias em casa, endividada e remoendo a viagem não feita. Isso tudo ele me disse, e também falou que me ajudaria com as despesas durante a viagem e ficou tentando me reanimar a viajar. Mas eu segui irredutível na minha súbita crise de consciência: não vou, não vou, não vou. Fabiano então disse: Ok, mas eu vou. Aí que cinco dias depois, a crise de consciência foi apaziguando, a vontade de ir foi voltando e eu resolvi ceder aos argumentos dele. Então, eu aceitei o desafio de fazer uma viagem o mais econômica possível, sem compras, comendo barato e tentando manter o monstro do impulso consumista sob controle. Sei que esse post tá muito "classe média sofre" e esse lugar que estou chamando de fundo do poço nem tá ruim (fundo do poço com viagem pra Europa tá é bom, né?), mas a compulsão existe e conviver com ela não tem sido fácil.

Agora faltam alguns dias para embarcarmos e temos que nos organizar para fazermos uma viagem o mais barata possível. E eu resolvi fazer um diário de bordo, começando nesses últimos dias que restam antes da nossa ida. Pensei em fazer um diário só para mim, naquele estilo bem adolescente de guardar segredos. Mas cheguei à conclusão que eu iria me boicotar, que sem a pressão social nada iria para a frente. Afinal, coerção social deve ser útil para algo, né. E foi assim que decidi me expor à vergonha pública. Como não consegui um grupinho de Consumistas Compulsivos Anônimos, escolhi vocês que lêem meu blog para serem avaliadores da minha saga. Tenho certeza que pelo menos um leitor esse blog tem: minha mãe. Então, mãe, capricha na bronca se eu escorregar, heim! 

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

À deriva (mar e vazio)


Mar

Dia a dia, o mar me invadiu. Ou melhor, o mar brotou de mim. Convivia com a água salgada. Lembro de um dia, que na minha memória parece ter sido o começo, o dia que o mar violento precisava sair, se revoltar. Eu tinha feito uma cirurgia e era um exame pós ciurgico. A cirurgia não foi nada, foi feita com anestesia. Mas esse exame. Puta que pariu, não dá pra expressar de outro jeito. Era pra medir o endométrio, ver o útero ou algo que o valha. Sem anestesia. Como doeu! Saí daquela sala e me sentei numa cadeira, na sala de espera, tonta de tanta dor. Sozinha, me sentindo um nada na vida. E fui pra casa. Quando cheguei, uma dor tão grande me invadiu, que chorei desesperadamente. Não era mais a dor do exame, era uma angústia inconsolável, uma dor que eu não sabia de onde vinha e que eu não consegui mais segurar. A dor queria romper. Em casa, chorava todos os dias, no trabalho, precisava fugir para o banheiro, deixar as lágrimas caírem e esperar que a vermelhidão do olho amenizasse. Mas as vezes nem dava pra segurar, o choro invadia até minha baia. E eu ficava ali, tentando esconder os olhos, tentando me esconder.


Vazio

Após minha primeira ida ao psiquiatra, passei a tomar remédios para dormir. A primeira experiência era meio comprimido por noite, mas não adiantava. Só consegui acertar a dose ao chegar a dois por noite. O remédio se chama Stilnox. Eu o tomava e era como embarcar no vácuo. Eu dormia oito horas por noite, mas não tinha sonhos, nem pesadelos. Era um vazio completo e escuro entre a hora que eu dormia e eu acordava. Mas eu me sentia bem, meu corpo descansava e a segurança de uma noite sem interrupções era o que eu precisava naquele momento.  Acordava sempre disposta, até que algo começou a acontecer, algo de muito estranho. Eu acordava e não conseguia me levantar da cama. Até então, eu não era de ficar enrolando, sempre acordava pronta pra começar o dia. Podia ser cinco, seis ou sete horas da manhã, eu acordava e ia viver. Mas aí se tornou muito difícil levantar da cama. Não era vontade de dormir mais, ou simplesmente olhar para o teto. Era como se durante a noite, um bloco de cimento tivesse caído sobre mim, moldado meu corpo à cama e formado uma massa pesada, resistente e difícil de remover. Era assim que eu me sentia, havia algo muito pesado sobre mim, que me impedia de me movimentar. Eu estava acordada, mas não conseguia me levantar. E aqui é muito difícil de explicar. Não era uma opção, não era preguiça, não era dormir de novo, era uma incapacidade de me mover. Ficava um tempo assim, não sei quanto mas parecia muito, até vencer a paralisia e conseguir levantar.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

À deriva (areia e neblina)


Eu não sei como começou ou se tem um início. Mas o que me chamava atenção era a ausência de apetite. Não sentia mais fome, e não conseguia saber quando precisava repor energia. Claro que, nesse quesito, as convenções sociais ajudavam. Almoçar era um evento puramente social. Saía para almoçar e até comia. Mas, com o tempo, comer ficou difícil e se tornou um tormento. Comer um biscoito de cream cracker no café da manhã era quase insuportável, como comer areia (um biscoito mesmo, não um pacote). E só o fazia porque sabia que precisava. Nos almoços, só comia 10%, 20% de um prato. Por mais que eu tentasse, não conseguia. E me sentia envergonhada. Não conseguia mais que os almoços fossem aquele momento de descontração no meio do expediente. Era doloroso não conseguir compartilhar com os outros a alegria de comer, a ânsia por saciedade. Tinha que enfrentar os olhares de indignação dos garçons e a inevitável pergunta dos gerentes: havia alguma coisa no prato que a desagradou? Eu definhava e todos elogiavam a minha magreza. A cada elogio, era como um aviso sonoro, um tormento: você não está bem!


Meu corpo não pedia comida, meu corpo não pedia descanso. Sempre dormi pouco. Seis horas de sono eram suficientes, às vezes até cinco. Tenho insônia desde os quinze anos. Acordava no meio da noite e disputava a TV com meu pai, sempre insone. Mas isso não me incomodava. Até que passei de uma insônia intermitente para uma insônia permanente. Não dormia mais, meu dia durava umas vinte e duas horas. E eu nem me dava conta. Só percebi ser uma insone constante ao constatar que assisti a duas temporadas de Lost em cinco noites, e trabalhando durante o dia. Era o sol que nunca se punha, e eu sempre alerta. Como um náufrago à espera de um salva vidas. E foi a minha primeira ida ao psiquiatra.